O meu pai me disse muitas coisas e algumas eram desculpa para um litígio entre nós. Pai & filha... quem nunca???
Ele me dizia: "os poetas que me desculpem, mas o respeito é mais importante do que o amor." Isso não era motivo de litígio entre nós, mas me soava a um discurso saturnino, a minha estupidez adolescente imaginando um Saturno pesadão, com anéis restritivos e uma foice certeira ceifando as aventuras de Vênus e Marte (e os seus equivalentes extra Via Láctea). Muitas chuvas depois, a minha estupidez (ou ingenuidade, permitindo-me uma dose de auto indulgência) foi diluída e a consciência lavada incorporou a ideia de que se não existir respeito, o que quer que seja que esteja rolando não é, de fato, amor. Porque a palavra esgarçada pelo uso e pela mídia perdeu a essência que vazou por sua trama esburacada.
Outra coisa que ele me dizia, menos filosófica (será?), mais tecnológica e, sem dúvida, incontestável, é que bastam três pontos para se estabelecer um plano... e que a humanidade teima em introduzir mais um onde não há necessidade. Esse discurso era invariavelmente precedido por uma experiência em cadeiras ou mesas dançantes e seguido pela confecção de um calço com guardanapo de papel (naquela época ainda não existiam os pinos niveladores).
Quando penso nas cores primárias, esse lance dos três pontos se apresenta muito claramente para mim e consigo até vê-lo discursando inconformado... Destas três cores (necessárias e suficientes) saem combinações para todas as outras, que podem se apresentar saturadas e nas variações queimada ou lavada, dependendo do que exigir a ocasião.
Tecnicamente falando, o que distingue uma cor da outra é o que se chama de matiz. Luminosidade correspondendo ao grau de claridade (lavagem) ou obscuridade (queimação) contido numa cor e, finalmente, croma referindo-se à saturação que indica o grau de pureza de cada cor (as cores perdem a saturação ao se misturarem com o branco). Três parâmetros suficientes (e necessários) para que se possa distinguir uma coisa da outra.
A força, a beleza suave ou a desagradável agressividade de certas cores ou de um conjunto de cores decorre do fenômeno de indução, que é a parte dinâmica do colorido. Um matiz é sempre mais impactante quando aparece com a respectiva coloração modificada como consequência da presença de outras cores. Nesta interação reside a essência da harmonia cromática.
A partir da ação do contraste mútuo e simultâneo que uma cor exerce sobre a outra, o fenômeno da interação se desencadeia em uma sequência, envolvendo todas as cores que, de uma forma ou de outra, participam do todo. O bom relacionamento ou a desarmonia que provocam provém dos parâmetros de cada cor que é colocada em confronto (acho que é preciso haver respeito das características de uma pela outra!).
Como todas as cores resultam da combinação das mesmas três primárias, deve-se considerar que cada uma delas possui, em escala variável, elementos que também participam (assim como numa família) da constituição das demais. É o que se poderia chamar de "tríplice personalidade da cor". Ao primeiro estímulo favorável, estas "personalidades" afloram, manifestando o vigor ou a brandura que lhes é inerente.
Na natureza, as cores estão sempre em harmonia, os três parâmetros estimulados ou inibidos de acordo com as luzes incidentes e refletidas do ambiente, meias-sombras e trevas que criam contrastes e brechas necessárias para que qualquer corpo ou conjunto de corpos revele a plenitude das suas potencialidades latentes.
Na essência da cor se encontra uma linguagem própria de grande riqueza expressiva, sem qualquer conotação ou paralelo com outras formas de expressão. Mensagens essencialmente visuais, podendo transmitir ideias e sentimentos tão precisos como a palavra ou o som. E no centro do imenso universo das induções cromáticas, situa-se a mais sutil manifestação das cores induzidas, o fenômeno chamado de cor inexistente, que surge em áreas incolores, como um fantasma, sem qualquer suporte químico da cor-pigmento.
Bibliografia:
Da Cor à Cor Inexistente - Israel Pedrosa / Senac 10a edição ISBN 978-85-7458-267-2
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